segunda-feira, 9 de maio de 2022

O racionalismo irracional

 

Esse capitalismo cognitivo financeirizado, na qual a produção material deixou de existir, tem nos arremessado para o interior de um certo racionalismo irracional, em que tudo dever ser detalhadamente justificado. Até mesmo as coisas mais banais do cotidiano requerem explicações que sejam minimamente satisfatórias. Com avanço tecnológico e o advento das redes sociais como parte dos meios de comunicações a situação tornou-se mais crítica. Pois, nas redes sociais esse dito racionalismo irracional, obra de um cartesianismo moderno e ilógico, fica muito mais evidente. Busca-se respostas para questões obvias e visíveis, que em grande parte encerra-se em si mesma. Mas a discussão em torno do assunto é levada até as últimas consequências, onde um lado não aceita o não como resposta final. O tema torna-se hiperbolizado e não se esgota em um simples sim ou não.

O racionalismo irracional, próprio deste capitalismo cognitivo, nasce justamente desse tempo de excesso informacional - um oceano infindável de informações e dados – da qual os meios de comunicação junto às tecnologias da informação e de redes sobrecarregam nossas mentes e nos intoxicam, gerando a síndrome do pensamento rápido. Exige-se soluções imediatas para antigos problemas que são resolvidos apenas se tivermos a capacidade total de concentração e reflexão. Está posto aí as contradições vindas desta modernidade severamente doente.

Pois, sobre este racionalismo irracional podemos dizer, então, trata-se de uma construção linguística, em que o excesso de racionalidade cartesiana nos faz movimentar para irracional, ou melhor, o nosso raciocínio para aquilo que é lógico, simples e evidente exige “porquês” cada vez mais profundo, explicações minimamente detalhadas, muitas vezes respostas insanas ou mesmo irrespondíveis. Nesta loucura do capitalismo cognitivo, nem o corpo e muito menos a mente se satisfaz com a singularidade do não e tudo precisa adentrar no nível da complexidade. Isso é o que denominamos de racionalismo irracional, não basta mais um sim ou não, toda reposta deve vir seguida de uma longa e laudatória explanação.

Com isso, as críticas tornaram-se mais ferrenhas, onde, por exemplo uma posição política deve ser detalhadamente explanada ao seu interlocutor (talvez, uma espécie de agente inquisidor). Hoje, qualquer falta de decisão, ou melhor indecisão é bastante mal vista pela sociedade, não cabe mais o ar da dúvida. O ficar em cima do muro virou um crime, dessa forma somos forçados a escolher e explicar nossas decisões. Então, para tudo que falamos deve-se ter uma reposta pronta, muitas vezes padronizada. De preferência aquelas que agradem os ouvidos do interlocutor.

Esse excesso monstruoso de informações e dados tem nos jogado para dentro desse racionalismo irracional, fruto de um capitalismo cognitivo vem escancarando a nossa fragilidade psicológica e o quanto somos carentes de informação reais e objetivas. Nos apegamos à superficialidade dos fatos, sem ao menos depurá-los e analisa-los minuciosamente. Isso tem gerado grandes problemas no âmbito da comunicação, pois temos disseminado com isso uma quantidade gigantesca de notícias falsas -  as famosas fake news.

O racionalismo irracional também pode atuar nesse ambiente de propagação da informação descabida, muitas vezes notícias sem qualquer conteúdo e fatos que carecem de uma averiguação mais detalhada, que mediante as redes sociais e plataformas de comunicação na internet tiveram sua audiência amplificada, fazendo com que uma simples imagem, vídeo, entrevista ou nota em um site, blog torna-se uma verdade absoluta e assim prejudicar a compreensão real dos fatos. Agora muitas dessas notícias a depender de sua repercussão, ou caráter vexatório acabam transformando-se em verdadeiros memes.

Contudo, a disseminação dessas informações falsas atinge diretamente o fazer cientifico e em nada contribui para a comunicação acadêmica. Para os meios de comunicação tradicionais, as notícias falsas em redes sociais são bastante prejudiciais, justamente por gerar confusões e favorecer no descrédito dos fatos e análises reportados por jornalistas sérios que ocupam os jornais impressos e os meios radio-televisivos.

Enfim, falar do racionalismo irracional pode parecer um tanto estranho, algo que parece longe de modo de pensar as coisas. Mas que recai justamente sobre a nossa incapacidade de absorver, analisar e reter grandes quantidades de informações, não pela sua escassez e sim pelo excesso. Fica mais fácil falar que o racionalismo irracional claramente sobrevoa nos céus da desinformação a da manipulação dos fatos, principalmente aqueles de cunho científico e político, que mais interessam ou não a grande parte da sociedade. Só sabemos que a síndrome do pensamento rápido e a busca frenética por soluções mágicas tem trazido uma enorme angustia para nós humanos, tornando-nos cada vez mais doentes. Bem, diversos estudos científicos apontam que os índices de doenças mentais, principalmente a depressão já são alarmantes em todo planeta. Vivemos, sem exagero, uma epidemia de doenças causadas pela tecnologias e excesso de informacional. Isso demonstra o quanto excesso de informação, o tempo que passamos nas redes sociais e nas plataformas tecnológicas, que deveria ser apenas uma ferramenta de produtividade, ou lazer pode ser altamente tóxica a nossa saúde mental e também física. Em suma, podemos dizer que esse tal de racionalismo irracional de certa forma tem uma forte ligação com o biocapitalismo de Antonio Negri e bebe da fonte do operaísmo italiano.

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