segunda-feira, 4 de abril de 2022

O fetiche da mercadoria nos tempos atuais

 

O capitalismo financeiro junto as tecnologias e redes elevaram ao extremo a financeirização, o dinheiro antes presente na forma fiduciária e material, agora tem ares amplamente descentralizado. Com a criação dos criptoativos, no intuito de ser uma moeda de lastro virtual (peer to peer) sem utilizar de mecanismos bancários, ou seja, sem intermediação de bancos.

As criptomoedas, um tipo de criptoativo, busca descentralizar as transações financeiras, com uso de bancos de dados distribuídos e criptografias de alta performance por meio da tecnologia de blockchain.  O blockchain é uma espécie de livro de registro contábil em meio digital que armazena transações realizadas com as criptomoedas

A economia e a política, assim como a tecnologia e suas aplicações, especialmente no mundo financeiro já é uma realidade irreversível para a sociedade, que coloca trabalhadores, empreendedores, políticos, cientistas e o cidadão dentro de um grande espetáculo, onde assumimos o papel de espectador e protagonista ao mesmo tempo. Todos nós somos sugados para o interior de um enorme moedor de carne, que tritura sonhos, esperanças, desejos, ideais e sentimentos. Somos apenas mais um em tantos bilhões a sermos esmagados como laranjas pelas estruturas desse novo capitalismo, da qual o dinheiro não existe de fato, mas apenas como um número dentro de uma tela virtual.

A existência da corporeidade do capitalismo financeiro agora se desloca para o universo do dinheiro digital, com advento das criptomoedas, não resta mais nenhum traço físico do capital. Agora tudo se tange para o espaço da virtualização, o mesmo ocorre com as relações afetivas. A afetividade superficial tomou conta das redes e os corpos fogem dos afetos. Talvez esse seja o extremo do capitalismo, em que as trocas se efetivam num ambiente binário de uma tela, um império de 0 e 1, que pode ser quebrada a qualquer momento pela computação quântica.

A sociedade deixou de ter até mesmo com o equivalente universal de troca (dinheiro) uma materialidade física, tudo se dá num ambiente metafísico, no sentido cósmico. Mas não neste cosmo espiritual, que se busca uma força latente e provedora do ser, e sim, num cosmo amorfo, um buraco negro que suga toda energia vivente.

Todavia, a moeda digital desvencilha-se das amarras dos velhos jogos econômicos e políticos que imperam no mundo físico. Não há mais uma dominação dos bancos centrais sobre o poder do capital, agora descentralizado. Novos atores da sociedade tecnológica, ou tecnocratas digitais, assumem o domínio de uma nova economia digitalizada, um tanto abstrata e intangível.  O dinheiro transita por dentro das máquinas e redes. O que é físico vai morrer, sem deixar um epitáfio em sua lápide.

O elemento por detrás das criptomoedas é um tanto anárquico e quem sabe um último paradigma econômico e social que busca definir as regras do jogo, anteriormente dominado pelo poder da velha tecnocracia e burocracia não weberiana dos governos e grandes corporações. A criptomoedas trata-se de um dinheiro que não compra, não consome e muito menos circula por vias obvias do mercado. O seu tráfego perpassa nas esferas espaciais das redes sem fio, computadores pessoais e muitas vezes no submundo das redes clandestinas da "deep web" que movimenta todo tipo de negócio escuso e ilegal.

Esse neo-anarquismo tecnológico, proposto pelas correntes de hackers, ciberpunks e especialistas em TI, cujo objetivo é escapar das regulamentações impostas pela economia tradicional dos governos direciona-se diametralmente numa posição oposta aos ideais do anarco-capitalismo desejado em alguns países latino-americanos. Pois, o neo-anarquismo tecnológico compromete-se com a liberdade total das formas de trocas monetárias via moeda digital não fabricada pelas instâncias do governo.

O neo-anarquismo tem como objetivo a descentralização das bases capitalistas e do Estado, pautando na plena liberdade do ser humano para agir conforme suas crenças e valores, ou até mesmo, debelando qualquer tipo valor e crença existente. Já, o anarco-capitalismo atua em prol da degringolação das instituições republicanas, num todo, que recai numa democracia doente, viciada, que deixa de atender as necessidades da população em detrimento dos movimentos liderados por milícias e algumas alas das igrejas evangélicas que visam sua monetarização.

Indo mais longe, a proposta do neo-anarquismo tecnológico de certa forma aproxima-se do antigo anarco-sindicalismo dos trabalhadores italianos da década de 30 do século XX. Digo isso, por que ambos guardam em devidas proporções a importância de a liberdade do ser humano em poder reivindicar para si amplos direitos, claro que cada um ao seu modo.

Tanto o neo-anarquismo tecnológico quanto o anarquismo sindicalista, apesar da distância cronológica previram as necessidades de mudanças que englobam o indivíduo dentro de uma coletividade, cujo o homem é o protagonista de suas ações. De modo contrário, o anarco-capitalismo procura preencher um espaço onde impera o caos e a violência. Não que os outros dois modelos anárquicos tenham sido constituídos pela violência, diferentemente sofreram mais violência, do que a utilizaram.       

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