terça-feira, 8 de junho de 2021

As frentes populares – o comum em redes

Uma frente popular de direitos neste caso pode ser definida nas palavras de Fumagalli (p.294), como uma comunidade de indivíduos livres que atuam como pessoas em comunidade. Portanto são pessoas que em seus espaços territoriais, sociais e econômicos atuam conjuntamente de maneira solidaria, na tentativa de pelo menos mitigar os problemas sociais.  

A ação isolada dos sindicatos e associações de trabalhadores é um tanto ineficaz e insuficiente perante a grande demanda e vulnerabilidade social e econômica daqueles que estão em situação de extrema pobreza. Faz-se mister a conjunção de uma frente popular ampla com base numa linguagem comum e em ações comuns para enredar-se numa teia de solidariedade. Essa, talvez seja, a genuína prática democrática participativa vinda daquilo que é o comum, proposto por Dardot e Laval.

No capitalismo cognitivo, a acumulação segundo Fumagalli (2010, p.323) é bioeconômica, que se realiza no desenvolvimento dos fluxos das redes, puramente imaterial. Isso, torna cada vez mais diminuto a participação coletiva e o comum sucumbe perante o mercado financeiro.

Numa bioeconomia somente as ações vindas de um corpo em movimento, em luta será capaz de transpor as atuais formas de alienação e expropriação do trabalho imaterial que servem as estruturas do capitalismo cognitivo. Por isso, a criação de uma consciência que se mova em uma direção autônoma e capaz de enfrentar os duros golpes que atingem toda sociedade.               

Ainda, a respeito das ideias do comum, o aparecimento das frentes populares, formada por setores mais progressistas da sociedade civil unem-se em prol de demandas especificas da população. Especificamente, nesse momento de sindemia, as frentes populares ganham força por meio das tecnologias de informação e comunicação (TICs), onde o uso das redes sociais aparece como um canal de abertura para discussão de temos ligados à política e economia, além de servir para movimentos de apoio e solidariedade.

As frentes populares agregam em seu interior diversos matizes da ideologia do campo progressista, contam com a participação de entidades sindicais, representantes da igreja, de partidos políticos e movimentos sociais (negros, indígenas, LGBTs, mulheres e outros), que juntos enredam um importante círculo de compartilhamento de conhecimentos e trocas de experiências. Essas frentes populares beneficiam-se das redes sociais numa comunicação mais direta, síncrona e com objetivo de alcançar o maior número de espectadores, num trabalho coletivo e de ordem social. Cabem as elas o papel de porta-voz da democracia participativa, ou seja, levar demandas especificas de um coletivo para as representações políticas instituídas.

Enquanto o capitalismo cognitivo concentra-se no indivíduo, ou seja, toda produção e reprodução imaterial está calcada numa única célula e na identidade. As frentes populares procuram quebrar essa lógica do individualismo e do identitarismo (o igual, o mesmo, o idem), justamente por aceitar e celebrar o diferente (o outro). Tal atitude permite agregarmos diferentes fazeres e saberes, conhecimentos tácitos, que de certo modo ampliam as trocas de experiências entre seus membros.

Na verdade, as frentes populares formam uma enorme rede de conhecimentos informais numa trama de nós e laços, que em conjunto realizam a acumulação de novos saberes. O entrelaçamento e os fluxos dessas redes permitem as frentes populares terem grande influência em muitas decisões tomadas pelos entes políticos.

Em alguns aspectos os trabalhos desenvolvidos pelas frentes populares caracterizam-se pela regionalidade e localidade de suas ações, atuando de forma consistente em pequenas cidades, bairros e dependendo da ação desenvolvida, atuam nos estados.

O comum descrito por Dardot e Laval é o inverso do individual e do identitarismo que o capitalismo cognitivo nos impõem goela abaixo. O comum congrega o coletivo, aquilo pertencente a todos e a ninguém aos mesmo tempo. Pois, o corte transversal do coletivo outorga sustentabilidade para a democracia participativa, onde diferentes grupos de pensamentos diversos unem-se ao redor de um bem comum. 

No coletivo cabe o progressismo dos sindicatos, entidades e associações já tão definhadas pelas mudanças nas relações de trabalho; os conselhos formados por representantes da sociedade civil, e traz fortemente a formação das frentes populares que agregam pessoas, no intuito de realizar ações em favor da população. Por ser parte do comum, as frentes populares não desejam uma organização jurídica e formal, preferem manter seu caráter informal e atuar numa rede de relacionamento, a qual cada participante move-se em prol do bem comum.

DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. Comum: ensaio sobre a revolução no século XXI. Tradução de Mariana Echalar. São Paulo: Boitempo, 2017. 647p.

FUMAGALLI, Andrea, Bioeconomia y capitalismo cognitivo: hacia um nuevo paradigma de acumulación. Traducción del: Antônio Antôn Hernandez elt al. Madrid: Traficante de Sueños, 2010. 336p.  



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