quinta-feira, 27 de outubro de 2016

Uma pequena nota sobre o livro "Aplausos para Cecília" (Sônia Mara)

É muito comum nós seres humanos julgarmos os outros sem conhecermos seu passado. Não procuramos ir a fundo para saber a história das pessoas  e com isso deixamos de aprender com elas a mais sublime essência da vida. Pois, as melhores histórias são aquelas dotadas de simplicidade e sabedoria que provém de nossos antepassados, que nos fazem refletir a vida. Muitas desses casos escondem em si medos, incertezas, angústias, amarguras, tristezas, decepções, dores e traumas que nunca se fecham, são apenas amenizados pelo tempo e talvez juntam-se aos raríssimos momentos de alegria e paz. Para que possamos ter a clara compreensão do universo que nos cerca é necessário sabedoria, mas não essa colocada pelos bancos da escola e sim aquela vinda daqueles que nos antecede. O aprender com estes verdadeiros sábios estão em suas palavras simples, cheias de ensinamento de quem nasceu numa vida sofrida, privados do amor, do carinho.
Encontramos em grandes escritores como Guimarães Rosa, Fernando Sabino e entre outros mineiros a prosa que destaca muito bem essa simplória sabedoria. Nos mais recônditos cantos destas Minas Gerais estórias se tornaram famosas para o resto do mundo, apresentando a magia deste povo guerreiro. As tradições, costumes, a religiosidade e segredos das pequenas cidades mineiras guardam enormes relíquias sobre sua gente. Suas histórias, muitas delas trancadas a sete chaves, escondem magoas e desencontros internalizados pela vergonha e medo. Talvez a melhor forma de  amenizar os traumas vividos seja jogar pata fora tudo aquilo que nos corroí por dentro. Então, escrever, falar e contar causos pode ser uma saída para os males, um modo de evitar que o passado não esteja mais presente na roda do futuro, ou seja volte a acontecer. Por que aquele que não admite seu passado está condenado repeti-lo no futuro.
A pequena introdução feita anteriormente é justamente para refletirmos sobre como as dificuldades impostas pela vida podem nos tornar sábios e ao mesmo tempo "externizar" essa sabedoria pode ensinar aos outros a lidar com suas angústias de maneira serena, amenizando os traumas. Quanto a ideia descrita sobre as pacatas cidades de Minas Gerais (hoje nem tão pacata assim, pelo fato da violência ter tomado conta delas), é por que as melhores histórias as tratam como um povo acolhedor, hospitaleiro, que sabe receber visitas com mesa farta de broa de fubá, pão de queijo, café de qualidade e leite. Mas nesta resenha a narrativa não vai alcançar estes saberes ou mesmo o modo de vida nas "Gerais". O livro a ser resenhado emite um parecer sobre os desencontros familiares, ficando assim no âmbito do primeiro parágrafo que trata da sabedoria pelo revés da vida. Agora adentraremos de fato ao livro intitulado "Aplausos  para Cecília" de Sônia Mara que com uma escrita objetiva e sem rodeios, permitindo uma leitura agradável e reflexiva, aquilatando-se aos grandes escritores mineiros já citados  acima anteriormente. A obra da autora expõem como os sonhos e desejos de criança podem ser simplesmente destruídos pela degeneração do seio familiar, que faz perdurar por gerações e gerações uma cicatriz inapagável, um verdadeiro trauma que nem mesmo a psicanálise Freudiana daria conta de apaga-la. Entretanto a exteriorização do fato através da palavra escrita foi a melhor forma da autora externalizar e exorcizar os sentimentos mais profundo de angústias, amarguras, tristeza e ressentimentos deixados pelos seus antepassados. Sendo que o abandono dos filhos por uma mãe para viver com seu amante é uma temática muito forte principalmente num tempo em que tal assunto era um tabu, talvez um "sacrilégio, um ato de loucura em uma sociedade conservadora, machista e patriarcal neste vasto interior das Minas Gerais.  Digamos enfim,  que o livro "Aplausos para Cecília" de Sônia Mara traz a tona um drama familiar, o abandono dos filhos pela mãe adúltera, cuja protagonista a menina Cecília se vê órfã de mãe e pai vivos tem de aprender a sobreviver não só com a miséria humana, mas a falta de amor e carinho. Observa-se na obra não uma superação, e sim a aceitação e sublimação dos fatos ocorridos. Portanto,  o livro da autora nos faz pensar sobre como a ausência dos pais pode gerar enormes danos nos filhos, contada numa história simples, mas sobre um assunto tão complexo.  

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