Incels, Red Pills e o mundo das mulheres: uma análise crítica
Em tempos de "Incels" e "Red Pills", bizarrices que povoam as redes sociais, a infosfera e as mídias digitais com seus discursos de ódio as minorias, em destaque contra as mulheres, de maneira sórdida e dissimulada - talvez um tanto desrespeitoso - subjugam a mulher numa posição de outro, num lugar de inferioridade. Mas para compreendermos tamanho preconceito em relação as mulheres vindos desses sujeitos da modernidade, faz-se necessário conhecer o significado dos termos. Pois então, os termos "incel" e "red pill" emergiram
em comunidades online e, embora distintos, compartilham uma visão de mundo
problemática em relação às mulheres e aos relacionamentos. Entender suas nuances
e interconexões é crucial para analisar seu impacto e suas implicações sociais. Especificamente, os "incels" é a
abreviação de "involuntary celibate"
ligados ao celibato involuntário e a misoginia. Refere-se a indivíduos, predominantemente homens
heterossexuais, que se definem como incapazes de encontrar parceiras românticas
ou sexuais, apesar do desejo por tais relações. A ideologia "incel" é marcada
pelas ideias de: vitimização masculina (acreditam ser oprimidos pelas mulheres, sendo que historicamente foi o oposto); misoginia (ódio e desprezo pelo sexo oposto); hierarquia sexual com base no status social e nas características físicas que rotulam os homens como atraentes ou não. Em torno da ideia dos "red pills" o termo faz referência ao filme Matrix por representar o
despertar para uma suposta realidade oculta sobre a natureza das mulheres, dos
relacionamentos e da dinâmica de poder entre os gêneros. Suas crenças em relação as mulheres pautam-se na: hipergamia feminina (
as
mulheres são biologicamente programadas para buscar parceiros com status
social e recursos superiores aos seus); natureza
"fútil" e "manipuladora" das mulheres (visão estereotipada que as retrata como superficialmente
interessadas em aparência e poder); o
pressão
masculina na sociedade moderna (alegação de que o feminismo e a correção política
criaram uma sociedade tendenciosa contra os homens); necessidade
de "despertar" os outros homens (senso de superioridade
intelectual sobre aqueles que não viram a verdade - "blue
pilled"- mais uma vez a alusão ao filme Matrix). Embora nem todos os "incels" se identifiquem como
"red pill" e nem todos os adeptos da "red pill" sejam "incels", existe uma sobreposição significativa entre essas comunidades. A
ideologia "red pill" oferece uma "explicação" para a falta
de sucesso romântico dos "incels", atribuindo-a à suposta natureza das mulheres e
à estrutura social "feminista". Em troca, a frustração e o
ressentimento dos "incels" fornecem um terreno fértil para a aceitação das ideias
"red pill". No entanto, ambas ideologias têm um impacto negativo e perigoso no mundo das
mulheres de várias maneiras, tais como: objetificação
e desumanização, que reduzem as mulheres
a objetos sexuais ou a seres manipuladores, negando sua individualidade,
complexidade e autonomia; justificativa
para o ódio e a violência, sendo uma visão de mundo misógina que pode levar à hostilidade online, assédio e, em
casos extremos, à violência real contra as mulheres; criação
de um ambiente online tóxico que contribuem para a proliferação de discursos de ódio e
à normalização de atitudes sexistas e misóginas; e por fim o reforço
de estereótipos de gênero prejudiciais, assim perpetuando visões simplistas e negativas sobre
homens e mulheres, dificultando relacionamentos saudáveis e igualitários. Do outro lado, a própria mídia tem gerado certos desconfortos sociais ao criar denominações um tanto preconceituosas, como a ideia de "masculinidade tóxica", em que determina o homem como um tirânico, um ser desprezível e vil que atenta contra a moral, os valores e os bons costumes da sociedade. Entretanto, precisamos sair dessa "racionalidade", ou melhor "irracionalidade" do determinismo da linguagem midiática, e assim transpormos para questões mais fecundas, quem sabe aprofundar-se num debate que possa de fato centrar fogo no problema. Da mesma forma, assuntos relacionados ao preconceito racial, tanto como as lutas de classes fecham-se em polêmicas, críticas e muitas vezes em discórdias. As questões relacionadas ao papel das mulheres na sociedade ganham alguns holofotes, porém os embates nas arenas políticas, econômicas e sociais ainda são timidamente discutidas com alguma profundidade. Do ponto de vista histórico a luta feminista é um tanto recente, dado que a mulher ainda permanece sob a tutela de um mundo masculino. O modelo capitalista - em si - já é uma construção da sociedade masculina, cujo homem é o detentor do poder do capital. Nesse contexto, a mulher submete-se aos caprichos do capital, ou seja, ao poder dos homens. Isso faz dela um ser que se coloca aos pés do "Deus-dinheiro" fabricado pelo homem. No mundo capitalista a mulher é apenas uma peça, uma composição simplória de toda engrenagem que move o motor da sociedade. Por outro lado, a visão de coletividade - proposta pelo ideais socialistas, ou comunistas - abarca uma premissa de igualdade entre homens e mulheres, melhor ainda, a liberdade feminina em que ambos teoricamente são vistos como trabalhadores, e portanto teriam direitos iguais ou semelhantes em suas diferenças. A mulher no regime coletivo a princípio estaria no mesmo patamar dos homens, já que seus direitos são garantidos pelo Estado. No mesmo caminho, a luta feminista seria tão inconstante, quanto à luta de classes, contudo, essa última faz-se num ambiente de dominação masculina, própria do poder capitalista e da qual os acordos assinados não inclui efetivamente as reivindicações da mulher - relegadas apenas ao papel de mãe, esposa ou filha. Quando inseridas no mundo do trabalho ficam aquém das oportunidades, alijadas das funções de comando e dos melhores salários. Com avanço da sociedade neoliberal, onde o índivíduo é o centro e não mais a sociedade, a mulher é mais uma peça secundária no mundo trabalho, apesar de assumir uma dupla jornada - o lar e o trabalho remunerado - ainda sofre discriminação em relação ao homem. Portanto é fundamental reconhecer a natureza prejudicial
dessas ideologias e combatê-las através da educação, do diálogo e da promoção
de valores de respeito, igualdade e empatia. Compreender a gênese e a dinâmica
dessas comunidades é o primeiro passo para mitigar seu impacto negativo na
sociedade e, em particular, no mundo das mulheres. Como disse a grande filósofa Simone de Beauvoir: "quando for abolida a servidão infinita da mulher, quando ela viver para ela, tendo-a liberdade do homem, será ela então o quiser: poeta, escritora, pintota, prostituta, cortesã, ou apenas mulher.
REFERÊNCIAS:
BEAUVOIR, Simone de. O segundo
sexo. Tradução de Sérgio Milliet. 43. ed. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 2015. v. 1: Fatos e mitos.
BEAUVOIR, Simone de. O segundo
sexo. Tradução de Sérgio Milliet. 43. ed. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 2015. v. 2: A Experiência Vivida.
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