O liberalismo de Hayek
pauta-se no erro do individualismo, numa liberdade econômica e social que
coloca em perigo as estruturas sociais. O avanço do neoliberalismo é um exemplo
claro do desejo de Hayek, onde sua concretização tornaria uma catástrofe
econômica e social. Portanto, a ideia de um mercado desregulado, sem regras,
sem normas e sem leis; na qual prevalece o individualismo acabaria num estado
de anomia, um território hostil, apenas ao deleite do capital. O mercado ao
contrário de Hayek, não possui mecanismos de autorregulação, estes ficam nas
mãos dos governos e das políticas públicas de bem-estar social.
Ao fazer a seguinte
afirmação, Hayek se esquece que quase todo o período da história foi marcado
por uma forte presença do capitalismo dotado de grandes contradições sociais e
econômicas, cuja população em sua maioria viviam em extrema pobreza, amenizadas
pelas lutas dos trabalhadores e dos movimentos sindicais. Portanto, a liberdade
pregada por Hayek fica apenas no espectro do mercado, ou seja, daqueles que
compõem os meios de produção e assim tornarem absolutos em seu poder. Por isso,
a sua crítica ao socialismo soa como algo no mínimo passível de desconfiança ao
falar que se trata de um sistema que impede a liberdade e de cunho coercitivo.
O socialismo não tenta minar qualquer possibilidade de revolução, pelo
contrário, sua gênese está na luta revolucionária.
Hayek tece em seu livro
críticas à planificação econômica, própria dos modelos socialistas. Ele, porém,
não percebe que a planificação da economia trata-se de um instrumento vital
para construir políticas públicas, que são próprias de um Estado preocupado com
organização e o desenvolvimento social. A planificação econômica tem um viés
progressistas pautado na redistribuição da renda de forma igualitário e
usualmente previstas nos modelos de bem-estar social.
A planificação
econômica, nada mais é que o gerenciamento pelo Estado dos recursos e a sua
aplicação. Ao contrário do neoliberalismo, que prontifica-se apenas multiplicar
seus lucros e enriquecer uns poucos, à custa da alienação do trabalhador.
Percebe-se neste autor
uma certa falácia, quando demonstra a planificação econômica como um meio para
se chegar a um determinador comum, sendo ela, na verdade uma finalidade, um
construto para uma sociedade mais organizada.
Nesse ponto as ideias
de Hayek fazem algum sentido, quando diz que o socialismo é uma espécie de
coletivismo. No entanto, sabemos que o coletivismo é o próprio socialismo. Se
compartilhamos o comum que a todos pertencem, então há o coletivo,
concomitantemente existe fundamentos socialistas. Mas parece que Hayek não
explicitou muito bem o sentido de coletivo, deixando dúvidas sobre o assunto.
Assim esclarecemos que o coletivismo e a economia planificada têm suas raízes
no planejamento económico amplamente difundido em economias de países que se
preocupam em estabelecer regras para os gastos públicos e desenvolver projetos
que visam a distribuição de renda e o pleno emprego. O coletivismo enquadra-se
na perspectiva de uma relativa igualdade própria dos ideais de Proudhon e Marx.
Talvez inconscientemente, o próprio Hayek reafirma sua posição em favor da planificação
e do coletivismo ao abordar o planejamento num sentido distributivo.
Ainda nesse caminho do
planejamento, não tem como fugirmos da criação de um plano central elaborado
para ser capaz de fornecer um caminho na utilização dos recursos materiais e
humanos. Ao trazemos para os dias atuais observaremos que a doutrina neoliberal
de Hayek vem perdendo força, principalmente neste momento de sindemia. Muitas
nações que trilharam o caminho do Estado mínimo e o fim das políticas de
bem-estar social, para surfarem nas ondas do capital financeiro e o mercado
livre retrocederam e estão reimplantado as originais políticas de Estado, além
da reestatização de instituições e empresa públicas. Grosso modo, a doutrina
liberal de Hayek mostrou-se incapaz de lidar com as adversidades e as
constantes crises que ela mesmo provocou. Enfim, as grandes corporações acabam
pedindo arrego aos cofres públicos.
Hayek diz ser um
liberal, no entanto não tem suas crenças num amplo modelo de sistema económico.
Na verdade, ele é um polarizador por acreditar que os sistemas econômicos se
fecham numa dualidade capitalismo / socialismo. No entanto, sabemos que outras
correntes económicas, principalmente na ala progressista, foram amplamente
discutidas e apresentadas como alternativas. O próprio exemplo dado pelo autor
do socialismo competitivo emerge como oposição viável a ideologia do mercado
amplamente livre e sem qualquer tipo de regulação, fator este que termina numa
espécie de anarco-capitalismo. A ideia do socialismo competitivo, sim é
plausível, nada tem de ilusório. A partir do momento em que suas bases estão
colocadas sobre a esfinge do planejamento, juntamente com a preservação da
liberdade individual.
Há um erro conceitual,
por parte dos liberais, ao associar o coletivo como um gênero interligado ao
fascismo, nazismo e qualquer outro "ismo" de caráter totalitário.
Faz-se inadvertidamente ou propositalmente essa falsa ligação como um
subterfúgio para desconstruir o papel do Estado enquanto mantenedor das
políticas de bem-estar social e o interesse comum. O coletivo como parte do
comum tem seu raio de ação na autonomia do ser e na construção social advindo
de proposições pautadas no bem comum e na igualdade, que joga por terra as
acepções do liberalismo e do individualismo. De fato, tudo aquilo que permeia o
comum se traduz na organização social e política, com adoção de valores
intrinsecamente humanos e dentro de um plano ético e moral.
Não, o capitalismo de
forma alguma significa democracia, conforme apregoa Hayek. O fato de termos a
propriedade privada livre não significa mais liberdade. A democracia caminha
pela participação coletiva, por um planejamento adequado de projetos sociais
organizados pela sociedade civil através de dispositivos jurídicos e legais.
Portanto, o neoliberalismo defendido por Hayek, não implica que o capitalismo
seja um sistema libertador, dado que as forças totalitárias do nazismo e
fascismo floresceram sob a égide do capital e em cima de uma democracia
esgarçada e cambaleante.
Temos que ter em mente
que o controle econômico não reside apenas nas autoridades encarregadas do
planejamento central como afirma Hayek. No seu mundo liberal, o controle
econômico também está presente no capital e em seus detentores, que dominam o
poder económico e fazem dele um instrumento coercitivo que se apodera dos bens
comuns e dessa mesma maneira submete o homem a uma condição servil. De fato, as
condições económicas, assim como outras devem ser planejadas coletivamente - é
não - individualmente, conforme propõe Hayek. Por que só o coletivo tem a
capacidade entender que a democracia se faz a partir do esforço participativo,
mas sabe que depende de forças representativas.
O desenvolvimento de
uma sociedade planejada está pautado justamente na ideia da distribuição da riqueza
de maneira equânime. Aspecto esse, que a liberdade econômica do capitalismo tem
sido incapaz de realizar.
Na maioria das nações
em desenvolvimento a segurança da renda não foi totalmente alcançada,
geralmente, essas nações possuem uma forte presença do livre mercado, onde a
população não recebe quase nenhuma assistência vinda do Estado, impera um alto
grau de corrupção, tanto de agentes públicos, quanto das corporações privada.
Elas possuem um Estado fraco e ausente, que se baseia em leis rígidas e
praticamente nenhuma política pública social. Trata-se de nações com uma
democracia fragilizada e propensa aos desmandos de governos autoritários, neles
- o sistema capitalista encontra um ambiente bastante propício para desenvolver
suas práticas de reprodução.
As técnicas de
propaganda são utilizadas não somente pelos regimes totalitários, o sistema
capitalista aproveita-se dos meios de comunicação de forma apelativa para
veicular suas mercadorias e serviços. O livre mercado e sua enorme
competitividade necessita de um público consumidor, ávidos a gastar, e nem que
para isso entrem num sistema pernicioso de crédito fácil e de endividamento. No
capitalismo atual prevalece o sistema de dívidas, em que o capital financeiro
beneficia-se das dívidas, dos empréstimos e dos juros. A todo momento, o
indivíduo se vê bombardeado pelos meios de comunicação com constantes
propagandas de crédito fácil. Com isso, a mais-valia de Marx sai da exploração
do trabalhador e passa a residir na exploração do ser humano como um todo. A
produção deixa de ser tangível e recai na intangibilidade proposta pela
linguagem mercadológica do mercado financeiro. Tudo se resume aos ativos e
passivos demonstrados em uma planilha eletrônica.
A liberdade de pensamento, na visão de Hayek, só pode florescer em uma sociedade de livre mercado, sem a presença do poder estatal, o que não é verdade. Talvez ele não compreenda que "general intellect" de Marx, ou seja o saber difuso da sociedade, que nos permite construir relações coletivas. No entanto, é esse saber difuso (coletivo) o principal instrumento de criação de tecnologias e inovações - muitas vezes apropriados e patenteados pelas grandes corporações que dominam o mercado - o exemplo das vacinas e medicamentos, que geram bilhões para grandes corporações farmacêuticas. Está aí o grande equívoco do pensamento livre adentrar apenas as sociedades ditas neoliberais. Hayek mesmo diz que o pensamento se constrói pela diversidade e interação dos indivíduos, então por si só, já configura-se uma nuance do coletivo, uma trilha em direção ao "general Intellect' marxista, que para ser livre, jamais deveria estar sob o domínio seja de um poder totalitário, ou do livre mercado, e sim sob os auspícios do comum.
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