O capitalismo financeiro junto as
tecnologias e redes elevaram ao extremo a financeirização, o dinheiro antes
presente na forma fiduciária e material, agora tem ares amplamente
descentralizado. Com a criação dos criptoativos, no intuito de ser uma moeda de
lastro virtual (peer to peer) sem utilizar de mecanismos bancários, ou seja,
sem intermediação de bancos.
As criptomoedas, um tipo de
criptoativo, busca descentralizar as transações financeiras, com uso de bancos
de dados distribuídos e criptografias de alta performance por meio da
tecnologia de blockchain. O blockchain é
uma espécie de livro de registro contábil em meio digital que armazena
transações realizadas com as criptomoedas
A economia e a política, assim como a
tecnologia e suas aplicações, especialmente no mundo financeiro já é uma
realidade irreversível para a sociedade, que coloca trabalhadores,
empreendedores, políticos, cientistas e o cidadão dentro de um grande
espetáculo, onde assumimos o papel de espectador e protagonista ao mesmo tempo.
Todos nós somos sugados para o interior de um enorme moedor de carne, que
tritura sonhos, esperanças, desejos, ideais e sentimentos. Somos apenas mais um
em tantos bilhões a sermos esmagados como laranjas pelas estruturas desse novo
capitalismo, da qual o dinheiro não existe de fato, mas apenas como um número
dentro de uma tela virtual.
A existência da corporeidade do
capitalismo financeiro agora se desloca para o universo do dinheiro digital,
com advento das criptomoedas, não resta mais nenhum traço físico do capital.
Agora tudo se tange para o espaço da virtualização, o mesmo ocorre com as
relações afetivas. A afetividade superficial tomou conta das redes e os corpos
fogem dos afetos. Talvez esse seja o extremo do capitalismo, em que as trocas se
efetivam num ambiente binário de uma tela, um império de 0 e 1, que pode ser
quebrada a qualquer momento pela computação quântica.
A sociedade deixou de ter até mesmo
com o equivalente universal de troca (dinheiro) uma materialidade física, tudo
se dá num ambiente metafísico, no sentido cósmico. Mas não neste cosmo
espiritual, que se busca uma força latente e provedora do ser, e sim, num cosmo
amorfo, um buraco negro que suga toda energia vivente.
Todavia, a moeda digital
desvencilha-se das amarras dos velhos jogos econômicos e políticos que imperam
no mundo físico. Não há mais uma dominação dos bancos centrais sobre o poder do
capital, agora descentralizado. Novos atores da sociedade tecnológica, ou
tecnocratas digitais, assumem o domínio de uma nova economia digitalizada, um
tanto abstrata e intangível. O dinheiro
transita por dentro das máquinas e redes. O que é físico vai morrer, sem deixar
um epitáfio em sua lápide.
O elemento por detrás das
criptomoedas é um tanto anárquico e quem sabe um último paradigma econômico e
social que busca definir as regras do jogo, anteriormente dominado pelo poder
da velha tecnocracia e burocracia não weberiana dos governos e grandes
corporações. A criptomoedas trata-se de um dinheiro que não compra, não consome
e muito menos circula por vias obvias do mercado. O seu tráfego perpassa nas
esferas espaciais das redes sem fio, computadores pessoais e muitas vezes no
submundo das redes clandestinas da "deep web" que movimenta todo tipo
de negócio escuso e ilegal.
Esse neo-anarquismo tecnológico,
proposto pelas correntes de hackers, ciberpunks e especialistas em TI, cujo
objetivo é escapar das regulamentações impostas pela economia tradicional dos
governos direciona-se diametralmente numa posição oposta aos ideais do
anarco-capitalismo desejado em alguns países latino-americanos. Pois, o
neo-anarquismo tecnológico compromete-se com a liberdade total das formas de
trocas monetárias via moeda digital não fabricada pelas instâncias do governo.
O neo-anarquismo tem como objetivo a
descentralização das bases capitalistas e do Estado, pautando na plena
liberdade do ser humano para agir conforme suas crenças e valores, ou até
mesmo, debelando qualquer tipo valor e crença existente. Já, o
anarco-capitalismo atua em prol da degringolação das instituições republicanas,
num todo, que recai numa democracia doente, viciada, que deixa de atender as
necessidades da população em detrimento dos movimentos liderados por milícias e
algumas alas das igrejas evangélicas que visam sua monetarização.
Indo mais longe, a proposta do
neo-anarquismo tecnológico de certa forma aproxima-se do antigo anarco-sindicalismo
dos trabalhadores italianos da década de 30 do século XX. Digo isso, por que
ambos guardam em devidas proporções a importância de a liberdade do ser humano
em poder reivindicar para si amplos direitos, claro que cada um ao seu modo.
Tanto o neo-anarquismo tecnológico quanto
o anarquismo sindicalista, apesar da distância cronológica previram as
necessidades de mudanças que englobam o indivíduo dentro de uma coletividade,
cujo o homem é o protagonista de suas ações. De modo contrário, o anarco-capitalismo
procura preencher um espaço onde impera o caos e a violência. Não que os outros
dois modelos anárquicos tenham sido constituídos pela violência, diferentemente
sofreram mais violência, do que a utilizaram.